quarta-feira, 14 de março de 2012

Refletindo sobre o Autismo

Um breve ensaio sobre o Autismo...
Por Elaine Cristina Alves de Carvalho Leal.

Sempre que posso costumo pensar sobre as pessoas com as quais convivo, suas vidas, suas aprendizagens, suas diferenças, atitudes, medos, tristezas, alegrias, fraquezas e fortalezas. Como Professora sinto-me agraciada pelas aprendizagens que tive com todas as pessoas com as quais convivi, aquelas chamadas de Alunos.
Os Alunos conseguem um efeito motivador em minha vida, nada comparável aos remédios antidepressivos. Seus efeitos são duradouros e rápidos. Ao entrar no corredor de uma Escola sinto um bem estar inexplicável.
Contudo não estou aqui para poetizar minha prática pedagógica, mas sim para compartilhar algumas experiências acerca de um transtorno global do desenvolvimento que afeta muitas crianças, jovens e adultos, aos quais os corredores de uma Escola podem ter um efeito nada agradável, caso não sejam acompanhados por profissionais especializados. Falo do Transtorno do Espectro Autista.
Conhecido como um desarranjo com bases neurológicas, afetando principalmente a área da linguagem e seus processamentos, o Autismo tem uma característica instigante para todos os bons observadores: - Por que em pleno século XXI, ainda existem pessoas que se espantam com a palavra Autismo? Por que ainda temos pessoas que desconhecem totalmente as potencialidades dos indivíduos autistas sejam eles crianças ou adultos? Por que ainda hoje presenciamos mães em diversos ambientes sociais justificando, sob olhares curiosos, os motivos pelo comportamento diferenciado dos seus filhos? Por que temos tanta dificuldade em entender o Autismo?
Não pretendo fornecer respostas prontas, porém gostaria de convidar aos possíveis leitores deste texto a analisarem essa questão pelo sentido mais simples, o sentido etimológico. Sim etimologicamente a palavra espectro tem um sentido que nos remete a dois consensos dialéticos: Fantasia e Fantasma.
Pensando no contexto da palavra Fantasia, sem muito esforço nos remetemos aos momentos em que por algum motivo nos desligamos de algo incomodante, pesado, para podermos descarregar, através da simbolização, nossas frustrações para depois retomarmos nossa Realidade.
Mas quando é que o contexto mágico do sentido Fantasia transforma-se no contexto pesado, solitário e assustador do sentido Fantasma?
A resposta pode ser mais simples do que imaginamos, ou melhor, sugere um humilde exercício de reflexão. Sim, refletir. Mas refletir exige provocação. Qual o papel do sentido mágico da Fantasia na solidão? Pois é fantasiar sem enxergar o Outro, sem a aprovação do Outro, sem a admiração do Outro, sem o olhar do Outro, torna-se pouco a pouco pesado, triste, desanimador e frustrante. Daí surge o sentido do Fantasma.
O Fantasma do estar só, do caminhar só, do procurar só!
Esse é o drama das famílias com filhos autistas o sentido Fantasma sobrepondo-se demasiadamente ao sentido Fantasia. O Fantasma do preconceito, do desconhecimento, da falta de estrutura multidisciplinar e pedagógica de acompanhamento a seus filhos e o mais assustador o Fantasma do futuro, do como será o amanhã dos filhos e filhas autistas, o trabalho, a vida social, o amor!?
Os leitores mais céticos dirão: - Mas o amanhã é construído hoje! Com certeza e é por isso que resolvi construir este texto, para que juntos possamos vislumbrar um hoje mais responsável e comprometido para as crianças, adolescentes e adultos autistas e suas respectivas famílias. Um hoje que enxergue o autista como um cidadão a ser respeitado dentro de suas dificuldades e potencialidades, mas não aquele respeito segregador da piedade, mas o respeito libertador do amor.
O respeito da criação e fortalecimento de equipes multidisciplinares para os atendimentos e acompanhamentos dos casos de autismo no país inteiro. O respeito da manutenção de políticas públicas de inclusão escolar e social, inclusive no tocante ao mundo do trabalho. O respeito pelo direito a Fantasia de inúmeros pais e mães de sonharem com o futuro promissor de seus filhos, sem o Fantasma do preconceito, do desconhecimento, da segregação e principalmente da falta de comprometimento governamental.
Enfim, caro leitor, a respeito de Fantasias e Fantasmas, proponho um novo olhar e um novo pensar sobre o Espectro Autista, conforme citado no Dicionário da Paz, o olhar da “aceitação, enquanto atitude de respeito ao Outro”. E um pensar também citado neste mesmo dicionário, o pensar da “transformação revisando velhos conceitos e atitudes e aquisição de novas perspectivas, conceitos e atitudes, num processo de mudança”. Mudança essa que permita paz e dignidade para as famílias e indivíduos autistas.


4 comentários:

  1. Parabéns, Elaine, mas parabéns mesmo! Faltam pessoas como você no movimento autista, pessoas que percebam e externalizem pedagogicamente a necessidade de aceitação na acepção da palavra.

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  2. Elaine, texto muito interessante e esclarecedor em seus mais variados aspectos.

    Primeiramente ao ver o amor pelo o que você esta fazendo ... "Ao entrar no corredor de uma Escola sinto um bem estar inexplicável", creio que uma das causas de tantos problemas que as pessoas enfrentam em seu dia é que normalmente fazem o que não gostam e ao entrar em seu ambiente de trabalho - ocorre o contrário do que você coloca.

    Sobre o autismo a exemplo de outras diferenças que existem na sociedade - o preconceito é a falta de preparo e de informações das pessoas sobre o tema e seu texto joga luz nesta questão.

    Parabéns!

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  3. Ter um filho/a autista é muuuito difícil de aceitar e muito você me ajudou em nossas conversas lá na escola.O texto é ótimo e é muito confortante saber que existem pessoas que como você se importam.
    Obrigada por me mostrar que muito mais forte que o fantasma é a FANTASIA e ela só aparece com a aceitação e o amor imponderável que nós mães sentimos.
    Beijo grande, amiga!

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  4. PARABÉNS ELAINE PELO BELÍSSIMO TEXTO, SEU TRABALHO DEVE SER TAMBÉM MARAVILHO, PERCEBE=SE O QUANTO DE AMOR HÁ EM SUAS PALAVRAS, É MUITO BOM SABER QUE AINDA EXISTEM PESSOAS TÃO DEDICADAS A ESSE TEMA, TÃO DIFICIL DE SER COMPREENDIDO EM PLENO SÉCULO XXI!!! PRAZER "CONHECE-LA"!!

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